"Ser ou não ser" |
Durante a semana que passou, as
mídias sociais e tradicionais foram inundadas pela notícia, e respectivas
análises e comentários, que um professor de filosofia de Taguatinga, no
Distrito Federal, havia chamado a cantora de funk Valesca Popozuda de “grande
pensadora contemporânea” em uma questão de uma avaliação de seus alunos.
Para o amigo leitor que de alguma
forma não tivera ciência de tal pergunta, eis o texto na integra:
“Segundo a grande pensadora contemporânea Waleska Popuzada, se bater de
frente é:
a) É só tiro porrada e bomba
b) É só beijinho no ombro
c) É recalque
d) É vida longa”
Para os incautos, a resposta
correta é a alternativa “a”.
Como era de se esperar, a
repercussão foi enorme. Os indignados de plantão começaram sua campanha
difamatória, tanto contra a cantora quanto ao professor. Calma, minha gente,
muita calma. Eu, juro, no primeiro momento, achei tudo muito engraçado, não
conseguia parar de pensar que o professor estava era tirando um grande barato
dos seus alunos, ou dos seus superiores, ou teria alguma agenda por de trás
disso.
Já durante a semana que passou, o
dito professor fez várias entrevistas para diversos veículos midiáticos. Eu
ouvi uma entrevista dele para a rádio BandNews FM aqui de São Paulo, e quando o
jornalista Ricardo Boerchat perguntou o porquê da pergunta o mestre explicou
que ele estava ensinando para os alunos o papel da mídia na formação moral do
cidadão, sendo que ela – e sempre ela – só se interessa pelos fatos negativos
que acontecem na escola pública. Ele alega que convidou a imprensa para visitar
uma exposição de fotos tiradas pelos seus alunos e que ninguém apareceu, foi
então que ele resolveu fazer a pergunta sobre a cantora carioca.
Eu entendo perfeitamente a boa
intenção que ele teve nesse, digamos, experimento, porém é preciso se lembrar
que a mídia também é um negócio, ai eu proponho um questionamento: em qual
notícia você clicaria em um portal de notícias para ler, a da exposição de
fotos de alunos do Ensino Médio ou da pergunta sobre a Popozuda? Fazendo o mea culpa, eu definitivamente clicaria
na segunda, como por sinal, cliquei.
Então chegamos em um dos pontos
chaves do problema: o professor utilizou da ironia em seu discurso, e como
sabemos, esta figura de linguagem depende de contexto e igualdade de saberes
para poder ser entendida, e até admirada.
O que mais vi nas timelines da vida foram questionamentos,
e acusações partidária, de como ele poderia chamar “essa mulher” de “grande
pensadora contemporânea”. Acho que o que mais irrita os indignados de plantão
ou foi o adjetivo superlativo empregado ou ter transformado uma cantora
popular, no sentido mais conotativo possível, em uma formadora de opinião, o
que de fato ela é mesmo.
Aliás, o professor quando
questionado sobre se ele achava a Popozuda uma pensadora ele deu uma de suas
melhores respostas: “segundo a filosofia
francesa contemporânea, todo ser capaz de criar conceitos é um pensador, e a
Valesca Popozuda cria conceitos, portanto ela é, com certeza, uma pensadora”.
Sem mais da minha parte.
Esse episódio só me mostrou, de
novo, o quão rápida é a resposta das mídias sociais para assuntos “polêmicos”,
e geralmente atrapalhadamente, e quanto de ranço a classe média e a elite
brasileira tem das manifestações culturais vindas das camadas menos
desfavorecidas. Valesca Popozuda, conceitualmente, é tão pensadora quanto os
Caetanos e Chicos da vida, e por que somente a segunda parcela da música
popular brasileira pode ser elevado ao píncaros da sofisticação intelectual? E
não, indignado de plantão, não acredito que a primeira se equivale aos segundos
em qualidade lírica ou melódica, mas apenas em categoria, todos representam
extratos da música popular feita no Brasil. Aliás, nos dias de hoje, quem seria
mais popular, não no sentido de conhecido, mas no sentido de falar ao povo, os
Chicos e Caetanos ou as Valescas?
Sobre toda essa celeuma, acredito
que a melhor posição de tudo isso é da própria Valesca, declarando que tudo era
uma grande bobagem. Ou seja, ela deu um grande “beijinho no ombro” para tudo
isso.
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